INTRODUÇÃO
O sofrimento faz parte da vida humana através de diferentes circunstâncias e por causas variadas. Atinge o ser humano naquilo que realmente é, e por isso, muitas vezes a crise existencial. Surge como sinal da sua fraqueza, afeta todo o corpo e vence levando-o à morte.
Nesta monografia pretendemos abordar a questão do
sofrimento na vida do ser humano. Assunto esse presente na vida e no contexto
de todo aquele tem consciência de sua existência. Nossa análise partirá da
pesquisa bíblica, ou seja, constatar o tema do sofrimento no Antigo e no Novo
Testamento.
Na criatura do Antigo Testamento apareceram
inumeráveis tipos sofrimentos, a qual destacaremos a questão da doença. Porém,
profundos testemunhos do Antigo Testamento atestam a preocupação de Deus com a
sua criatura, que estando doente e em sofrimento, deseja conduzi-la para o
futuro, ao conhecimento de si mesma e do seu Criador. No Novo Testamento a
perspectiva concentra-se na pessoa de Cristo sobre a cruz, assim como a
mensagem da sua ressurreição. Deus não libertou Cristo da cruz, pois, por
certo, havia alguma coisa melhor que ser poupado da cruz. Portanto, a resposta
cristã ao problema do sofrimento humano deve ser analisada por meio do
sofrimento de Cristo.
A seguir, passaremos a abordar o sofrimento na
perspectiva da teologia sistemática, em que aponta a questão da presença e da
existência do mal, responsável pelo sofrimento na vida do ser humano. Fica
impossível negar a realidade do sofrimento humano e impossível também aceitar
as teologias que surgem oferecendo o fim do sofrimento como: “Pare de sofrer!” A
cruz derrama luz sobre o escândalo, profundamente evocado, do sofrimento. Deus através de Cristo Jesus, seu Filho,
compartilha o sofrimento, físico, moral e espiritual num ato de ‘compaixão’ e
por amor ao sofredor. Deus se solidariza com todo o sofrimento da humanidade,
que pode, seja qual for, volver seu olhar para a cruz.
O Jesus sofredor é o reflexo da experiência de luta
do latino americano pela sobrevivência, pelas injustiças sociais, pelo moderno
sistema de dominação dos países desenvolvidos. Tudo isso reflete o sofrimento
no dia-a-dia em nosso país, basta vermos como resultado, o desemprego, a falta
de saneamento básico e instrução. Também há o descaso das autoridades, quanto à
saúde. E o que dizer das guerras? Milhares, na América Latina, são oriundos de
guerras, da escravidão, da expoliação, do extermínio, dos massacres. Muitos
sofrem a injustiça de seus opressores; outros, vítimas da sede de poder
político e econômico, são vítimas fáceis no consumo de drogas das mais variadas
e sofrem então as conseqüências desse abuso e engano.
O povo vive seu sofrimento, embora a bandeira da
esperança, asteada, proclama que Deus está ao lado dos que sofrem e não os
abandonará jamais. A fé e a esperança em Cristo são apresentadas nesse contexto
de sofrimento, porém, como um remédio ao sofrimento, tendo o ressurreto, como
paradigma à Vida, hoje e eternamente na América Latina.
1. TEOLOGIA BÍBLICA
1.1. ABORDAGEM SOBRE O SOFRIMENTO NO ANTIGO TESTAMENTO
1.1.1. Ser Humano: Criatura de Deus
No Gênesis, Deus
aparece como Senhor absoluto e Criador (Gn1.1-2.4a). Em sua palavra,
transcendente em poder, numa ação livre superior e com autoridade plena sobre a
criação, cria também o ser humano; o qual depende de Deus. Precisa de espaço
vital, sustento, ocupação, comunidade, comunicação, descanso, e , então Deus
providenciou tudo, até o dia do descanso. Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de
Deus o criou; homem e mulher os criou (Gn 1.27).
Assim, sabemos
que todo ser humano é criatura de Deus, plasmada à sua imagem, aberto para Deus
e revelando-O, o Único Absoluto Criador, um ser de Deus. Deus é a fonte
criadora de toda pessoa humana, por amor, fazendo o ser humano à sua imagem e semelhança.
É o Criador e o mesmo que elege e redime. As Escrituras falam em Deus, Criador
do universo e do gênero humano. Deus cria, age e opera em sua criação. O ser
humano não é Deus, porque feito, porque criado; porém Deus o eleva acima de
todas outras criaturas soprando-lhe da vida divina. A criatura
humana foi projetada para que correspondesse a Deus na sua condição de
Intermediária entre o mundo e o Criado[1].
A plasmação do barro da terra, no sentido
bíblico, acena à fragilidade e limitações próprias da natureza humana (Jó
10.4).
O sopro de vida significa a vitalidade
humana que está sempre referida a Deus, é o espírito de vida, sua força vital.
O Ser humano tanto é terreno quanto carnal; tanto corpóreo quanto sentimento,
tanto emoções, quanto transcendência.
Carne e sangue fazem a pessoa humana[2].
A limitação do
homem, sua fragilidade se confirma na
pergunta: Que é o homem? (Sl.8.4). Seus dias são contados e a morte é inevitável, é um sopro. O homem é como um sopro; os seus dias,
como a sombra que passa (Sl.144.4).
A Bíblia fala da transitoriedade humana e
fala dos seus limites e metaforicamente o faz assim: A vida do homem é como uma
sombra. (Jó 8.9) como os dias de um jornaleiro. (Jó 7.1) como uma lançadeira.
(Jó 7.6) como um mensageiro rápido. (Jó 9.25) como uma expansão de apenas um
palmo. (Sl 39.5) como a urdidura de um tecelão. (Is 38.1-2)[4].
A
carne dá suporte à vida e é Deus que a sustenta com o seu sopro. Quando Deus
retira o seu sopro, a carne, caduca e impotente, volta ao pó de onde proveio.
Porém o homem adoece num todo, na carne (basar Gn 2.21b); no espírito
(rûah
Sl 146.4); ou no coração (leb Jr 4.19); embora o AT não traga tricotomia ou dicotomia.
O seu viver na
terra não é fácil. É limitado pela sua finitude: sujeito às doenças,
degeneração das células e morte, porém Deus é a sua providência. (Jó 14.19;
Sl.104.14b-15). O homem, porque criatura, esquece-se e desobedece, possui a
faculdade de pecar, será sempre falível. Porque tu és pó e ao pó tornarás (Gn.3.19). Comete crime, se perde, é seduzido, e, atrai para si doenças.
Transgredir é
ação congênita do homem! Não aceitou ser humano, querendo antes ser “ como
deus”, se rebelou atraindo para si culpa, sofrimento, doença, morte. A ambição
humana é a fonte das doenças, mas em Deus está a cura e salvação. Assim já no AT, basar não só significa a
falta de força da criatura mortal, mas também a sua fraqueza quanto a
fidelidade e obediência em face da vontade de Deus[5].
1.1.2. Pecado X Doença
A doença,
portanto, na Bíblia, é concebida como situação de fraqueza física e de
experiência dos limites pessoais. O homem falha e suas falhas comprometem toda
a comunidade de Israel; uma ameaça à vida cultual de toda a congregação.
Na ideologia de
Israel cria-se que as doenças eram resultados de ofensa do homem à Divindade,
eram castigo. Todos os descendentes do primeiro pai, Adão, sofrem de doenças no
corpo por revoltar-se contra o “Criador Bondoso” no paraíso. É o mesmo
desequilíbrio nas relações de Adão e
Deus que agora juntamente com as falhas de cada pessoa aceleram as doenças, o
padecimento e a morte. Foi assim que o pecado marcou a ideologia dos judeus ao
referir-se à doença e então no AT encontramos o binômio “pecado-doença”.
No Antigo Testamento o homem é trabalhado como
um todo e quando doente também apresenta-se doente num todo. Deus é Jeová Rafá
que se apresenta para a recuperação do ser humano. Diante de nós temos clara
uma oposição saúde e doença ou ainda cura, (salvação) e doença. A salvação pela cura corresponde à ameaça
pela doença [6].
Erhard
Gerstenberger, em seu livro, “Por que Sofrer?” pergunta qual a causa para a
doença, dando primeiramente a resposta, possível de um israelita da
antigüidade. O mal presente
no mundo de modo inexplicável é tão natural como a cobra no paraíso (Gn 3.1)[7]. O homem do Antigo Testamento não localizava o mal em definitivo
porque o mal poderia estar aninhado no próprio homem. É bem possível que a
criatura humana tivesse transgredido, consciente ou não, “uma norma de comportamento
(Sl 38. 3-18). No decurso da história de Israel, a lei escrita de Javé impôs-se
passo a passo como norma cuja transgressão provocava doença (2Cr 21.12-20). Na justificativa
para as causas das doenças essa “auto-incriminação” é muito simples e não nos ajuda muito na compreensão das causas de
doenças ao homem sofredor do Antigo Testamento. O arbítrio de poderes malignos
poderia também causar certas doenças, como em Jó: o fato de o próprio Deus
admitir perante Satã: Incitasses contra ele, para o consumir sem causa (Jó
2.3). Então poderia se esperar sofrimentos impingidos por demônios ou inimigos.
1.1.3. As Doenças no Antigo Testamento
Muitas
doenças surgiram em Israel de diversas espécies, inclusive conhecidas e
disseminadas ainda hoje e até em sua maioria mortais e horríveis (Zac 14.12).
Para o homem do Antigo Testamento, era desesperador a incerteza da doença, pois
que alguns sintomas eram inequívocos e dependiam de um laudo oficial do
sacerdote ou do profeta (Lv 13; 1Sm 5-6) que declarava o doente puro ou impuro
para a preservação do culto a Deus. Uma
vez feito o diagnóstico, começa para o israelita uma luta de vida ou morte.
Pois toda doença “autêntica” é prenúncio de morte (Jó 33.19-22).
No Dt 28.28
aparecem descritas as doenças mentais: loucura e perturbação da razão; Isaías
1.5 fala da cabeça doente e também do coração enfermo, (2Rs 4.18ss; Sl 121.6).
Em Jeremias 4.19s encontra-se a descrição de um ataque do coração; e sintomas
de paralisia em 1Sm 25.37. No Antigo Testamento, a doença é uma calamidade mandada
por Iahweh, como castigo e somente Ele pode curá-la (Ex 12.12; 1Sm5.6; Sl
39.11). Unicamente Javé é o Senhor
da doença e da cura. Esta é a certeza bíblica inabalável[8].
O arrependimento
e a oração eram o principal tratamento nesses momentos. O próprio Deus em Dt
28.27 ameaçou os israelitas que, se abandonassem a sua fé, sofreriam de
úlceras. A lepra representa o pecado, metaforicamente falando, e se propaga,
contagia e é crônica. O Antigo Testamento traz a lepra como sendo uma das
piores doença retratando a impureza corporal que podia cair sobre o homem. No
seu ritual de purificação fica claro uma relação da doença com o pecado, com a
limitação da criatura, com a sua fragilidade e fraqueza ao falhar. O contato
com o morto também causava impureza, o grau mais elevado da impureza, o que sem
dúvida podia se originar em doenças.
No Antigo
Testamento as doenças que eram curadas, são as causadas, freqüentemente por
ferimentos. As feridas eram espremidas e untadas com azeite ou bálsamo (Is 1.6;
Jr 8.22). As fraturas eram encanadas (Ez 30.21). O profeta Isaías receita
cataplasmas de massa de figos ao rei Ezequias portador de tumores (2Rs 20.7; Is
38.21). A inveja foi a causadora de
doenças psíquicas no rei Saul (1Sm 16.14-23; 18.7-9; 19.8-10).
A vida e a morte,
com efeito, estão nas mãos de Deus: Ele usa contra o Egito (Ex 12.23), um anjo
que espalha a peste em Israel (2 Sm 24.15-16) ou entre o exército assírio (2 Rs
19.35). Com a permissão divina, Satanás, fere Jó na carne (Jó 2.3,7), o qual se
recusa aceitar as limitações de seu estado de ser criado. Procura em Deus as
razões das suas doenças. Acusa Deus de tirano caprichoso (Jó 9.18-29), de juiz
corrupto, como um animal feroz que dilacera a sua presa (Jó 16.7-9), condena a
justiça de Deus e está resolvido a manter a sua posição. Sem mudança, sem hesitação, sem
arrependimento![9].
Jó
quer que Deus reconheça o seu valor, rejeita a sua misericórdia e então fica
patente a fonte de sua doença. Como Adão, Jó também quer ser super-homem e até
“como deus”. Não há lugar para a graça de Deus!
Jó prossegue discutindo com Deus, mas por fim o silêncio! Descobre o seu
lugar no universo, a sua limitação, a sua finitude. A sua loucura nas
acusações, arrogâncias e julgamentos, o seu egocentrismo. E então não mais
ataca o seu Criador. E por fim a resposta: (Jó 42.1-6).
A criatura é tomada por sua finitude
quando recebe a revelação do infinito que cria. O homem descobre, assim, a
fragilidade e a grandeza de sua existência na junção que separa o ser do
não-ser e que, ao mesmo tempo, os une. Diante do Ser que ele reconhecia como a
fonte e o motor de sua existência, Jó perde o desejo de afirmação de si mesmo.
Ele tem então só uma frase a acrescentar: ‘sofro no pó e na cinza[10].
Concluímos essa
abordagem teológica sobre a doença e o sofrimento no Antigo Testamento mencionando a solução dada por Deus para o alívio
ou a cura, ou seja, a partir das doenças do Servo Sofredor, no livro do profeta
Isaías. Sim. Na morte vicária do Servo do Senhor a solução definitiva para a culpa,
a doença, o sofrimento e a morte do ser criado de Deus. Aprouve a Deus, e agradou-lhe fazê-lo
enfermar, sofrer, feri-lo, submetê-lo às doenças. O sofrimento e a doença não
são naturais para o Servo de Deus! Porém ele amou e quis ser homem, igualou-se
ao finito, ao criado. Aceitou uma condição não sua, solidariamente.
É
à luz desse evangelho profético da paixão de Cristo Jesus, o qual irrompe um
tempo novo, que abordaremos o tema Doença e Sofrimento no Novo Testamento. Segundo
o Novo Testamento, não se pode encontrar soluções para o problema do sentido do
sofrimento, senão tendo presente os sofrimentos de Jesus. Sentimos o desafio de
encontrar um sentido capaz de englobar o sofrimento e a doença numa dimensão de
vida e não de destruição, sempre lembrando que para o cristão, esse problema
está equacionado, pois que a própria morte se abre numa perspectiva de
ressurreição.
1.2. ABORDAGEM SOBRE O SOFRIMENTO NO NOVO TESTAMENTO
A mesma limitação
marca a passagem do Antigo para o Novo Testamento mediante a ação redentora de
Jesus a qual garante certo grau de independência das restrições humanas. Embora
o Novo Testamento repita a ideologia do Antigo quanto às doenças, completa-a
envolvendo-a numa visão otimista do universo e também se sobrepõem a ela. Cristo está presente entre os doentes numa
missão especial. Ele é precisamente o médico que não vem curar os que têm
saúde, mas sim os doentes(Mt 9.12-13).
1.2.1. Jesus e as Doenças
Cristo
inaugura o Reino de Deus. E como sinal da chegada desse Reino do Messias,
confronta as doenças e as cura, mas tomando-as para Si. E a Si mesmo não se
cura, tornando-se enfermo ensinando que doença é sinal da condição humana, mas
é sinal da graça de Deus, e também a cruz e a ressurreição, a vitória sobre as
doenças.
A
doença revela a fragilidade comum do homem diante de seu Deus, estando sempre
ligada à intenção ou vontade do Criador. Porém, no NT a doença está destinada a
desaparecer juntamente com a morte através da vinda do Messias, o Justo que
morre, ferido, doente no lugar do culpado. O sofrimento, na vida de Jesus, não
foi acidental, porém essencialmente foi um ato de salvação. Antecipou-se e
disse que lhe “era necessário sofrer”.
Jesus
Cristo trouxe sobre o binômio pecado x doença nova luz e não há a crença de que
toda enfermidade advém de culpa pessoal, pecado cometido pelo paciente e seus
familiares. Cristo não condena o doente e nem tem a doença como um castigo de
Deus, porque “nosso Deus é Pai de Bondade e Misericórdia” e a doença pode ser
para a glorificação (Lc 13.1-5; Jo 11.4). Deus também pode usar a doença como
correção (1Co 11.32; 2Co 4). Jesus não discute a responsabilidade pessoal do
cego de nascença (Jo 9), porém o autor o tem como um sinal revelador do enviado
supremo de Deus. O sinal é tão mais
importante porque a sua conseqüência é: “para que crendo tenhais vida em seu
nome”. Jesus rejeita uma ligação estreita entre pecado e doença. Doença no
NT também possui o conceito de
disciplina benéfica proveniente do amor misericordioso de Deus (Hb 12.4-13). A Providência Divina pode permitir que penosas
doenças acometam os justos não precisamente para castigá-los, mas em vista de
outros fins...[11]
1.2.2. A Humanidade de
Jesus
Jesus
no Novo Testamento é plenamente humano e limitado: sente dor (Lc 19.41; Jo
11.35; Mc 3.5), tem medo frente aos seus sofrimentos (Mc 14.34ss;Jo 12.27). Na
cruz grita sua dor. O sentido para as doenças e sofrimentos estão no próprio
Senhor Jesus Cristo, que assume a humanidade plena e como verdadeiro Servo de
Iahweh recebe em Si mesmo toda doença e morte.
O
desígnio de Deus, portanto, é que Cristo seja sacrificado em lugar do ser
criado, o homem, a fim de que nEle receba justificação, santificação, vida,
cura, saúde. É na morte de Cristo, que o mistério da doença e da morte se
revela. Cristo decreta saúde e vida e Ele mesmo as dá. Ele opera milagres para
salvar e também remover as doenças e o sofrimento dos homens. (Jo 10.10)
A
solução deve ser buscada no mistério de Deus. O homem descobre a coerência
desse mistério, isto é, a sabedoria de Deus e sua justiça, considerando a
harmonia que Deus coloca no mundo (Jó 38.1-42.6).
Jesus se condói com o
sofrimento humano: ele critica os que não fazem da compaixão seu primeiro dever
(Lc 13.15-16). Ele cura os enfermos que se aproximam dele com fé, e os evangelistas
reconhecem neste gesto de misericórdia (At 10.38) o sinal de sua função
messiânica (Lc 7.20-23) e de seu desejo de salvar toda a humanidade (Mt 8.17)[12].
Deus
é Aquele que ressuscita os mortos, é o poder que se faz valer sobre não só as
enfermidades mas também sobre a morte, redimindo os homens. Deus, todo poder,
misterioso, supremo e ilimitado e Jesus, o Cristo, o Poder, pode salvar o homem
não só do pecado mas das doenças do seu corpo frágil e limitado.
O
Novo Testamento relê o Servo Sofredor de Iahweh, a grandiosa figura descrita
pelo profeta Isaías, que alcança o seu pleno e mais alto significado. O aspecto
corporal torna-se realidade e símbolo da nova vida, que transforma todo homem
liberta-o da doença e da morte.
A concepção da morte expiatória e redentora no NT é um desenvolvimento da idéia
do Servo. A identificação de Jesus com o Servo deve ser atribuída ao próprio
Jesus[14].
Que salientou a novidade do seu caráter e o ensino sobre
o significado do sofrimento e da morte na experiência humana.
O
Servo Sofredor é a verdadeira “pessoa comunitária” que sofre em sua própria
pessoa e que santifica o sofrimento do grupo que ele representa. Os sofrimentos
pertencem também aos discípulos que querem seguir Jesus. Devem carregar a sua
cruz, beber o cálice do sofrimento estar prontos para a ignomínia, para a
perseguição e para a morte.
1.2.3. O Sofrimento na
Teologia Paulina
Na
Teologia Paulina não encontramos o termo doença. Porém o sofrimento como sendo
a marca da Igreja. É um dom divino. O cristão pode se alegrar no sofrimento. O
apóstolo Paulo recebe do Senhor a força para levar avante seu apostolado,
apesar de seu sofrimento (2Co 12.9s). Desenvolveu a teologia do sofrimento,
coincidindo com a sua teologia da cruz. Sim, a mensagem da cruz que não esconde
nada das humilhações do Messias padecente, é ao mesmo tempo, e em primeiro
lugar, uma mensagem de ressurreição e vida. Para o apóstolo todo o viver do
cristão é como uma tensão entre dois pólos: morrer e viver com Cristo. O
sofrimento causado pela doença, pertence à própria essência da vida cristã.
A
teologia paulina está fundamentada numa teologia de Jesus Cristo e o apóstolo
Paulo prega o Cristo crucificado. A sua doutrina é a teologia da salvação.
Assegura que o sofrimento de Cristo foi pelos nossos pecados e na forma de
servo. Para a salvação dos homens e para a reconciliação com Deus. O cristão
pode alegrar-se no sofrimento, pois é um sinal particular do amor de Deus. Os
sofrimentos do tempo presente não podem ser comparados com a glória futura
(Rm8.17). Paulo coloca também a idéia de que Deus castiga o homem piedoso para
depois salvá-lo do juízo (1Co 11.32).
O
cristão experimenta a vitória de Jesus sobre a morte participando pessoalmente
da morte de Jesus. O cristão é batizado na morte de Jesus, pois somente nessas
condições é que pode ressuscitar com Jesus para a nova vida.
Deus
pode permitir uma doença como meio salutar de correção. Paulo se gloria de sua
fraqueza, que se manifesta na sua enfermidade, “para que a força de Cristo
desça sobre mim” e “que a vida de Jesus se manifeste em nossa carne
mortal”. O apóstolo vê assim a
participação nos “sofrimentos de Cristo”(2Co1.5; Col 1.24), que sobrevêm à
Igreja, seu “corpo”, em fadigas e provações, e, então suporta por “amor dos
eleitos, a fim de que obtenham a salvação”. Aplicando a cada cristão
que também aceita a sua enfermidade como vinda da mão de Deus.
O
apóstolo, homem cheio de fé em Cristo, não foi curado de uma enfermidade, “um
espinho na carne”, que ele também chama “um anjo de Satanás que me esbofeteia”
(2Co 12.7); e por quê? Para que não se
ensoberbecesse com os dons recebidos de Deus. Pediu ao Senhor três vezes que o
livrasse desse padecer, porém não foi atendido; mas Cristo prometeu dar-lhe
graça para suportar, pois na fragilidade,
limitação e dependência do homem está o poder de Deus.
Concluindo,
o mistério do sofrimento de Cristo, Filho de Deus podemos resumir numa palavra,
amor. O poder de Deus sobre a vida e a morte aparece. Porém o mistério que
envolve a doença e o sofrimento na vida do homem deve continuar. Somente diante
de uma perspectiva escatológica o cristão obtém forças para suportá-lo. Pois,
sabe que, como Cristo deve passar pelo sofrimento e a morte, se deseja
ressuscitar e ter, na glória e ressurreição, vida plena. Por isso, então,
iniciamos a Teologia Sistemática abordando o tema Sofrimento como algo
inevitável na vida humana.
2. TEOLOGIA
SISTEMÁTICA
2.1. O Problema
do Mal e o Mistério da sua Existência
O mal é e continuará a ser o grande scandalum; e o problema de sua origem é
o verdadeiro tormentum da existência[15].
Na
história da criação o cenário era perfeito: O Espírito de Deus se movia sobre a face das águas (Gn 1.2). O ser humano é criado e colocado nesse cenário por Deus.
Deus mesmo o faz. Esse homem era dotado de uma natureza moral e portanto não
manchada pelo mal. Não havia lugar para o mal. A autoridade bíblica afirma que o mal não pertence à
verdadeira natureza do homem... o mal penetrou em nossa natureza – e em toda a
terra ao nosso redor – procedente de fora[16].
O
fundamento do mal, a sua essência está em o ser humano não atender, não
confiar, não obedecer à vontade de Deus. Deus, ao criar o ser humano à imagem
divina, o fez com capacidade para a escolha moral, o livre-arbítrio, obedecer
ou desobedecer. Se Deus tivesse evitado o mal, teria de nos fazer diferentes do
que somos. Para sermos humanos precisamos de certas capacidades, no agir, no
querer... O mal, portanto,
era um complemento necessário do bom plano de Deus para nos fazer plenamente
humanos[17].
Do
mal natural advêm as doenças, o sofrimento e finalmente a morte; sendo
qualificados humanos por atingir o ser humano. Muitos dos males físicos
acontecem devido ao mal moral: sofrimento e pecado não se relacionam
necessariamente em casos individuais, porém o egoísmo e o pecado humanos
explicam muitos dos males existentes no mundo.
Os seres humanos se esforçam a fim de descreverem e
decifrarem o problema do mal mas este
continua sendo um mistério. Alguns há que, diante do mal, negam Deus e toda
ordem e desculpam-se na sua inexistência. Outros dizem haver uma batalha, um
dualismo ferrenho entre o deus do mal e o deus do bem e por certo a vitória do
bem se dará na escatologia. Há outros que também culpam o pecado e a queda da
raça humana como responsáveis pelo mal. Claro está que estamos no meio de dois
princípios que por serem opostos não podem ser reconciliados e sofremos as conseqüências.
Embora a narrativa bíblica de Gênesis 3,
tente explicar a condição humana, não explica, contudo, a doutrina do pecado
original, mas deixa implícito que os seres humanos, por ocasião da Queda,
passaram à prática do mal, uma vez que sabiam discernir, então, o mal e o bem.
De um modo misterioso, então, o mal físico seguiu-se ao mal moral, e não
somente o homem foi atingido pelo pecado no Éden, mas toda a criação ficou sob
a influência do mal.
No Gênesis, então, estaria o relato da
transferência da maldade. A maldição pronunciada contra a humanidade, no Éden,
é então representada por fatores específicos que conduzem toda criação às
doenças, ao sofrimento, ao mal, e a morte. As tentativas para explicar a origem
do mal são muitas, no entanto, ao homem estava destinado à volta ao pó, à terra
donde foi tirado, pois que o ser humano não era imortal. Para Scheleiermacher, o
mal estava presente no homem mesmo em seu estado original, quando sua
consciência de Deus não era suficientemente forte para dominar a natureza
sensorial do homem, presa aos sentidos[18].
Scheleiermacher faz Deus responsável, uma vez que é o Criador da natureza
sensorial do homem.
Segundo a doutrina da Queda o homem é uma
criatura que não se ajustou ao universo, por ser má, e não porque Deus o tenha
feito assim, porém por possuir e abusar do seu livre arbítrio. O cristianismo
afirma que Deus criou todas as coisas boas e o livre-arbítrio das criaturas
racionais e isso incluía a possibilidade do mal a qual o homem escolheu e se
tornou mau. Então todos os homens pecaram em Adão e atraíram para si as
doenças, os sofrimentos e a morte. O mal é portanto inerente à própria
existência de um mundo onde almas podem encontrar-se ou perversamente se
ferirem umas às outras, causando o sofrimento.
Deus, em sua soberania, tolera o mal no
universo, sendo os homens, e não Deus, os responsáveis pela tortura, prisões,
escravidão, armas, bombas. Também a pobreza e o trabalho excessivo não são
frutos da natureza, senão do homem avarento e estúpido. A criatura deve
entregar-se ao seu Criador, e desempenhar intelectual, volitiva e
emocionalmente esse relacionamento dado no simples fato de ser uma criatura[19].
Porém o ser humano precisa aprender como
recobrar essa auto-entrega à semelhança de Cristo e essa rendição é uma espécie
de morte que inclui sofrimento. O sofrimento pode ser permitido para que
redunde em bênçãos espirituais (Tg 1.2-4); pode ser disciplinador e também com firme certeza de que não nos
pode separar do amor de Deus mas nos prepara para a glória (Rm 8.38,39; 8.18).
Os humanos tornam-se mais bondosos e simpáticos e são imbuídos do propósito
divino de vencer e eliminar o mal e com ele o sofrimento. O espírito humano não
se renderá enquanto tudo correr bem. O erro e o pecado são assim, “um mal
mascarado”. O sofrimento é um mal às claras, indiscutível; todo homem sabe que
algo está errado quando sente dor[20].
É impossível ignorar esse mal que apela por justiça. E, “a revelação divina
afirma a justiça de Deus em relação com o mal [21].
Existe a idéia de que o sofrimento seja um
‘castigo retributivo’ ou também a questão da vingança. Mas certo é que a
rendição completa a Deus exige sofrimento. O mal pode servir para castigos de
perversidades individuais e nacionais (Is 45.7; Lm 3.38; Amós 3.6). Se os
homens violam as leis básicas de Deus, com certeza receberão as repercussões de
suas próprias ações: aflição penal ou retributiva. A dor pode despertar o homem
para a realidade se este vive o sono da ilusão. Sim, o sofrimento pode ser a
voz de Deus para os perversos como para os salvos. Deus quer dar-nos algo, mas
não pode, porque nossas mãos estão cheias – não há nelas lugar para colocá-lo[22].
O que pode então Deus ..fazer em nosso
benefício senão tornar ‘nossa vida’ menos agradável, e remover as fontes
plausíveis da falsa felicidade? É justamente aqui, onde a providência divina parece
à primeira vista ser mais cruel, que a humildade divina, o rebaixamento do
Altíssimo merece o maior louvor[23].
Um forte senso de nossas misérias comuns,
pelo fato de sermos criaturas humanas, é um estímulo na remoção de todas as
misérias possíveis. A doutrina cristã de auto-rendição é obediência, é
teológica e isso a criatura deve ao seu Criador. A segurança que o homem
almeja, se alcançada neste mundo, por certo seria um obstáculo à volta a Deus.
O
pecado pode repetir-se porque a tentação original continua; mas, isoladamente,
o pecado por sua própria natureza gera o pecado, fortalecendo o mau hábito e
enfraquecendo a consciência. A dor então, como os outros males, pode naturalmente
repetir-se pelo fato de a causa da primeira dor estar ainda operando: mas a dor
não tem a tendência, por si só de proliferar. Quando ela acaba, acaba mesmo, e
a seqüência natural é alegria[25].
Deus tem um plano para o mundo apesar do aspecto
negativo do homem. Deus age buscando o homem com misericórdia num mundo
dominado pelo mal. A vontade divina e suas exigências são desproporcionais à
natureza humana, porém o Deus de Israel é Deus dos povos, cristãos e não
cristãos, é o Deus da Aliança. O
Criador, quer ser também o salvador de todos.
Cristo Jesus reconheceu o mal no
coração do ser humano, contudo amorosamente
eleva-o para uma dignidade divina, embora o seu campo de atividade seja
dominado pelo mal. Há exigência de esforço para se conseguir o ‘Reino de Deus’.
A estrutura do homem não se adequa às exigências do reino de Deus; o seu
coração faz o mal mas, também julga o justo. Quando Jesus, Homem, vai à cruz, o
mal fica manifesto em seu abismo mais profundo, pois que vence aquele que não
teve pecado.
Mas
este homem que, segundo a vontade de Deus, repara a maldade, tornando-se vítima
da mesma, transformando-se em victor
quia victima... Subjetivamente o malvado já está julgado por aquilo que procura
para si mesmo, declinando do bem [26].
Deus dirige sua ação salvadora ao homem na luta contra o mal. Isso é
visto em toda sua inteireza em Cristo Jesus que combatia as doenças, a dor, o
sofrimento. Mas é na cruz que é dado a resposta final para o problema do mal. A
humanidade pode ser transformada em sua maldade pelo triunfo de Cristo sobre
todos os poderes do mal. O mal será eliminado do
universo, e a criação compartilhará dos destino glorioso do homem redimido.
Tanto o mal físico como o mal moral serão banidos eternamente[27].
O
mal será punido, e a eterna vida assegurada, num tempo de grande julgamento, em
que cada pecado será revelado e também os fiéis. As imprecações das injustiças
e sofrimentos de inocentes, a prosperidade do mau e do sofrimento terão
respostas satisfatórias, por certo, na vida do porvir.
2.2. Teodicéia e
Mistério Cristão: Provém o Sofrimento de
Deus?
Cristo
nos revela Deus. Muitos compêndios de teologia procuram demonstrar a existência
de Deus falando de suas obras, do homem como uma obra especial e depois Cristo
o Deus-homem. A nossa teodicéia corresponde à fé que temos em Cristo Jesus
homem, o Deus-homem revelado. Deus se revela e também os seus infinitos
mistérios, quando quer, às capacidades humanas. Deus não pode ser compreendido por nós exceto quando
Ele se acomoda (attemperat) ao nosso padrão[28].
Há uma distância entre Deus e o homem a qual somente
Deus pode transpor, descendo às limitações da natureza humana. O homem criatura
não pode jamais vencer esta finitude. Calvino reconhecia que o ser humano, na
Criação, era um ser finito, limitado permanecendo assim essencialmente e sendo
um pecador acidentalmente.
Deus
em sua essência, é desconhecido e não podemos atingi-lo. Devemos manter nossos
pensamentos nos limites
impostos pela criação temporal e espacial, pois que
especular o tempo e o espaço infinitos de Deus não convém ao ser humano, porque
é possível somente a Deus. A revelação que o homem possui de Deus é aquela
histórica, a sua obra redentiva que se acomoda à capacidade humana agravada de
criatura pecadora.
Exatamente como revelação universal de Deus se
origina da Palavra criativa de Deus assim esta acomodação especial à condição
humana de pecado, ocorre exclusivamente através da própria humilhação que Deus
empreendeu quando o Filho Eterno assumiu o ofício de mediador[29].
Edward
A. Dowey, citando a teologia de Calvino diz que Deus não é jamais uma abstração que se relaciona com
uma humanidade em abstrato, mas Deus é o Deus do homem, cuja face está voltada
para nós e cuja pessoa e vontade são conhecidas[30]. O ser humano é
descrito a partir da sua relação com este Deus conhecido, porém continua sendo
homem criado e não deus. E como resultado do pecado, quando não olha para Deus
esta relação ainda assim não é substituída. O pecado sendo um afastamento de
Deus, contudo acontece na presença de Deus e redunda em glorificação do Senhor
por meio do ser pecador.
A hipocrisia não pode chegar ao ponto ‘da
mente não Ter mais nenhuma consciência da sua culpa na presença de Deus. Se o
pecado causasse uma relação completamente negativa entre Deus e a criatura, o
resultado seria autonomia: o homem não seria mais um mero homem, e satanás
seria um segundo Deus. Mas, toda a revolta contra Deus ocorre tanto dentro da
onipotência divina como dentro do campo da responsabilidade da criatura,
responsabilidade esta baseada no conhecimento[31].
A
teologia calvinista não separa o conhecimento de Deus da responsabilidade
religiosa moral. O ser humano responde a Deus cultuando e obedecendo-O pelo
conhecimento de Deus que a ele se revela e determina a sua situação
existencial. Não adianta ao homem conhecer um Deus com quem não pode
relacionar-se. Eticamente os cristãos são sacudidos no íntimo pelas exigências éticas da vontade de Deus e tendo uma revelação clara pode ousadamente dizer que conhece a
vontade de Deus. Calvino desenvolveu a doutrina da Onipotência de Deus e afirmou uma doutrina da
responsabilidade do indivíduo[32].
A queda e condenação do homem, ocorreu pela Sua própria
culpa, embora estas coisas resultem do decreto da vontade eterna e imutável de
Deus, que sendo um só, a fonte, suporte e fim de tudo é sobretudo justo e bom,
não caprichoso ou impassível.
2.3. Nos
Sofrimentos de Cristo a Compreensão do Sofrimento
Cristo
não propõe respostas metafísicas ao enigma do mal do sofrimento e da dor, mas
sim uma presença e uma atitude. Deus em Cristo sofre com o sofredor, é agredido
e crucificado e então é a partir dos sofrimentos de Cristo que conhecemos a
maneira pela qual Deus vê o mal, o sofrimento e a dor.
A história de Cristo é a história de uma
grande paixão, de uma passional consagração a Deus e seu reino, e com isso, e
justamente por causa disso, se tornou a história de uma paixão inaudita, de uma
agonia fatal. No centro da fé cristã encontra-se a paixão de um Cristo passional[33].
Os
sofrimentos de Cristo são sofridos em solidariedade com outros, sofrimentos
pelo mundo, sofrimentos necessários. Sua vida toda é marcada por sofrimentos à luz de sua mensagem
messiânica[34]. Sofrimentos que como dores de parto produzem algo bom. Moltmann, em
seu livro “O Caminho de Jesus Cristo” tematiza ‘Os sofrimentos de Cristo’ em
seu horizonte apocalíptico, como
esperança no Criador de uma nova criação. Jesus chama
seu discipulado levando-o à perseguição de poderes dominantes e sofrimentos,
pois que enviados como ‘ovelhas
para o meio de lobos’. Propõe, também características
dos sofrimentos de Israel, dos povos de Deus neste mundo sem Deus e também dos
profetas de Deus. Os ‘sofrimentos de Cristo’ esto abertos para a comunhão com
eles e também por amor de Cristo como os sofrimentos dos apóstolos e dos
mártires os quais transcendem a comunidade porque sofrimentos escatológicos que
envolvem toda criação. Os sofrimentos de Cristo abrangem também os sofrimentos
do tempo nuclear, sofrimentos cósmicos desse tempo ecológico.
2.4. Sofrimentos Humanos de Cristo
Jesus
morreu sua própria morte. Enquadrado como político perigoso, pretendendo ser o ‘rei dos
judeus’ cavou um processo contra si mesmo, recebendo a sentença de morte. Foram os romanos
que mataram Jesus, o Messias de Israel, um Messias paradoxo. Os homens mataram
Jesus, o Filho de Deus, o qual abandonado pelo Pai, Deus, agonizou na cruz e
gritou o seu abandono.
Jesus
morreu também a morte de um judeu e por isso nesse sofrimento Moltmann
reconhece os sofrimentos de Israel, que são sempre também os sofrimentos de
Deus compartilhados e então sofrimentos na proximidade de Deus e não no
abandono. Jesus morreu a
morte de um pobre, pois que destituído de seus direitos, sem pátria, sofreu o destino
de um escravo no Império Romano[35]. Um escravo
torturado, injuriado e crucificado, então ‘os sofrimentos de Cristo’ são também
sofrimentos dos pobres neste mundo.
Por
fim Jesus morreu a morte do vivo, pois era mortal e também teria morrido um sem ser executado. Moltmann,
partindo do dogma agostiniano-paulino de que a morte é o salário do pecado (Rm
6: 23), afirma que Jesus o
Filho de Deus não pode ter morrido a sua morte, pois que era sem pecado. Logo
Cristo morreu
somente por misericórdia, vicariamente, nossa morte, a morte dos pecadores [36]. Mortalidade faz
parte, sim, da natureza da finitude da criatura homem. A morte de Jesus na cruz
é a morte-maldição do pecado. Morreu na cruz a
própria morte natural em solidariedade com toda a natureza que geme, ‘sofrimentos
do tempo presente (Rm. 8.18).
2.5. Sofrimentos
Divinos de Cristo
Todos
os títulos de Cristo, expressados pelas comunidades Cristãs primitivas através
da sua fé em Jesus, tem seu fundamento teológico na ressurreição de Cristo. O
Cristo Ressurreto é Cristo não só pelo túmulo vazio, mas pelos seus sofrimentos
e morte na cruz. Sofrimentos divinos os quais devem ser compreendidos como os
sofrimentos de Deus. Na
entrega do Filho também o Pai se entrega, porém, não da mesma forma. O Pai
sofre a morte do Filho. Ele a sofre na imensa dor do amor pelo Filho[37]. A morte do Filho corresponde, por isso, a dor do Pai. Não só o Pai
entrega o Filho, porém, o Filho entrega-se a si mesmo, sendo objeto e sujeito.
Os ‘sofrimentos de Cristo’ também são os sofrimentos do Espírito, porque na
entrega de Cristo a renúncia do Espírito se revela. Assim como o Espírito é sujeito divino da história de
Jesus, assim ele é também o sujeito divino de sua história da paixão [38]. Então por meio desse
poder do ‘Espírito Eterno’, Jesus destruiu a morte em sua morte e o Pai que o abandona e entrega, sofre a morte do
filho na imensa dor do amor[39].
Moltmann
tomando o Gólgota como processo de teodicéia, pergunta: Jesus morre como o
grito do abandono – e onde fica Deus? E responde para análise: Deus oculta seu
rosto e silencia, e Jesus morre no silenciar de Deus: Por quê? Deus permite o
morrer de Jesus, abandonando-o sem Deus e impotente. Como? Deus quer que Jesus
morra assim. E tudo é feito pela ordem de Deus. O próprio Deus estava em Cristo. Jesus foi traído,
condenado e morto, e Deus reage ressucitando-o.
Por fim vós
intentastes o mal, Deus porém, intentou o bem (Gn.
50.20). E a cruz no Gólgota é transformada em bem.
O
sofrimento e entrega de Cristo, um caminho de esvaziamento, de morte na cruz é
co-sofrimento de Deus e é o caminho do amor divino. na entrega de Deus reside
um sofrimento ativo: Deus vai buscar suas criaturas perdidas que sofrem.
Moltmann cita Orígenes para falar em sofrimento de Deus por amor. Este sofrimento solidário, vicário e
remidor por meio de vicariedade é o sofrimento de Deus.
Deus se compadece tomando parte na dor e sofre um sofrimento do amor[40].
Concluindo,
Deus permite o sofrimento, porém não deixa de ser Onipotente. Sua divina
onipotência não se anula com a presença do sofrimento no mundo. E continua
eternamente desejando que todos se salvem, sejam libertos no sofrimento,
conhecendo-o em plena verdade.
Deus
envia Cristo que, em profundidade conheceu e provou o sofrimento, e então agora
concluímos que o sofrimento não é um problema para soluções, antes que se creia
em Deus; mas sim o sofrimento é a situação pela qual Deus se nos revela
assumindo-o solidariamente e transformando-o em semente de saúde, de
ressurreição, de vida. Portanto o sofrimento passa a ser um mistério a ser esclarecido
vivencialmente, alinhado em Cristo e sua
cruz, como veremos na Teologia Latino-Americana, cujo povo não tem a sua
situação vivencial transformada, e, então identifica-se com o sofrimento de
Cristo e também com o seu sangue vertido.
3. TEOLOGIA LATINO-AMERICANA
3.1. Sofrimento que Atinge a Todos: Uma Realidade na América Latina.
O sofrimento
afeta a todos. Seja pela doença física, pobreza, injustiça, opressão. E todos
nós, então, sofremos dores, sem dúvida, bem diversas. Existem os que sofrem
vendo um dos seus queridos sofrer e não podem consolá-los. Existem os que
sofrem por causa da miséria, uma realidade de sua vida: é preciso comer,
vestir, morar... Sim, o sofrimento
atinge a todos em momentos vários da vida. É um fato universal e ninguém pode
deixá-lo à margem.
A doença, é uma
das causas de sofrimento e é a filha preferida da morte, pela qual todos
passaremos. A doença atinge a todos, podendo envolver física, psicológica e
espiritualmente, além de ser a causadora de medo. Pode ser causada por vírus,
desnutrição, ferimentos, ingestão de substâncias tóxicas, desgaste ou
degeneração de algum órgão do corpo, ou outros motivos.
Como uma intrusa aparece privando o
ser humano da sua vida rotineira amedrontando-o, levando-o à entrega de seu
corpo a estranhos que o conduz como uma criança que recebe ordens. Horários,
regulamentos, afastamento da sociedade, da família da vida... Sim, afastamento da vida porque o fim desse
caminho é a morte e esse caminho é de dor de sofrimento de mal.
Moltmann, em seu livro “Deus na Criação”, diz
que as doenças afeta a pessoa toda, ou seja, em sua integralidade. As doenças se referem à pessoa pelo menos em
quatro dimensões, segundo tal autor:
1.Em sua auto-relação: A pessoa doente faz
uma nova experiência consigo mesma. Ela não está mais de acordo consigo mesma.
Ela precisa se re-encontrar.
2.Em sua relação social:
Estar doente significa, na maioria dos
casos, também um prejuízo nas relações sociais, a perda da atenção das
pessoas, a experiência de isolamento, etc. A pessoa doente primeiro precisa
aprender essa sua nova função, da mesma forma como os próximos precisam se
re-orientar em relação a ela.
3.Na história da vida:
Doença e fraqueza suscitam um conflito entre o projeto de vida e a experiência
de vida. Ficar doente muitas vezes significa enterrar esperanças. A pessoa faz,
então, experiências de despedida e uma pré-experiência de morte.
4.Na relação com o campo da transcendência: O
sofrimento questiona o sentido que foi vivido e também a falta de sentido que
foi vivenciada. Sofrimentos graves, no entanto, também, muitas vezes, revelam o
absurdo da vida normal. Nesta relação, doenças e sofrimento grave podem
conduzir a crises da confiança fundamental[41].
Doença,
então é uma disfunção orgânica e causa sofrimento; é uma instabilização do
sentimento próprio que segue com crise existencial, perda de sentido, perda de
contatos sociais. O sofrimento atinge a todos pois que:
É uma das marcas da finitude humana e um
significante da nossa mortalidade. Todos estamos sujeitos a esta condição de
num tempo ou noutro da vida ser atingidos por inúmeras condições que o
sofrimento assume[42].
O sofrimento traz
sentido à nossa existência; muito embora
não seja reconhecido pelo idealismo o seu desempenho para todo ser consciente
, a realidade vivida nos lembra sempre o sofrimento e a morte, nossa
vulnerabilidade. Fatalidade
ou não, o sofrimento perdura e a morte tem que passar, cedo ou tarde[43].
O
sofrimento é um tema de reflexão pluridisciplinar. Sempre pensamos no
sofrimento do outro. Num segundo momento é que pensamos o sofrimento em nós. A
dor é pessoal e só num segundo momento é que a projetamos aos outros e também a
experiência advinda da dor. Segundo Hubert Lepargneur, a dor traz o problema do significado e da
valorização do sofrimento[44].
Imaginar uma felicidade que desconheça a
contradição, que não assuma a dor, que não responda às perguntas mais
dramáticas do ser humano é imaginar uma felicidade irreal, ilusória e impossível.
Cedo ou mais tarde, todos nos defrontamos com o mal[45].
Porque
a presença do sofrimento, da aflição e do mal, na história,, na natureza e na
América Latina, a imagem de um Deus escondido leva a teologia para um confronto
urgente e inevitável. O mal é uma realidade. E o sofrimento, na América Latina,
parece ser injusto. Enquanto a religião, consoladora. E, a teologia fracassa em
interpretar um símbolo central do cristianismo, a cruz. É preciso renovar e
fortalecer a força de ser pessoa, conforme Moltmann chama de o espírito como afirmação da vida, o amor[46].
E
ainda o mesmo Moltmann oferece definições mínimas para melhor entendermos o que
vem a ser vida humana sujeita a sofrimento e morte.
Vida humana é vida aceita, afirmada e
amada. A força da existência humana está na aceitação, na afirmação e no amor
da vida fraca e mortal. Visto a partir dessa força para a vida, o morrer não é
um fim, e a morte não é a ‘separação da alma do corpo’, ou a total ‘falta de
relação’, mas uma passagem para um outro modo de ser e uma metamorfose numa
outra forma. A pessoa não foi criada em sua corporalidade para ter um fim na
morte, mas para transformar-se através dela. A esperança da ressurreição do
corpo e de uma vida eterna na salvação corresponde à criação corporal da pessoa
através de Deus, e a completa Esperança de ressurreição é fé na criação,
orientada para a frente[47].
Diante
da experiência de sofrimento, aflição e opressão na vida humana, parece
paradoxalmente, existir um Deus ausente, ou talvez um Deus contemplativo ou
ainda um Deus escondido, alheio aos gritos do sofredor latino-americano.
É
nesse contexto que a teologia da libertação faz uma reflexão sobre Deus,
mediante as lutas dos excluídos, marginalizados, colonizados e sofridos.
Para os teólogos da libertação cristãos a
manifestação de Deus na história e na sociedade está situada onde Deus está
aparentemente mais ausente: nos rostos de povos inteiros crucificados. Deus se
manifesta no escondimento, a saber, em lugares de pobreza, morte e sofrimento.
Segundo Gustavo Gutierrez, por exemplo, a teologia deve alimentar-se com a
manifestação de Deus na fraqueza e no escândalo da cruz. Mas também como Jó, não podemos refrear nossa língua. Com
humildade devemos deixar que ressoe na história o grito de Jesus na cruz e que
ele nutra nosso esforço teológico[48].
Em
face do mal mortífero, a ausência ou a indiferença de Deus ao sofrimento na
natureza e na história é que está a necessidade de uma teologia da cruz
permanente, pois que lugar de sofrimento, negatividade, conflito e morte. Se
existe um modo de conceber o sofrimento que oculta a Deus, também há um modo de
crer em Deus, que esclarece e explica o sofrimento, a cruz no calvário.
Para
compreendermos a verdadeira resposta ao porquê do sofrimento, precisamos voltar
a nossa atenção à revelação do amor divino, fonte última do sentido de tudo. O
amor divino ajuda-nos a encontrar sentido para o sofrimento e na medida que
compreendemos este amor, descobrimos ”para que” o sofrimento. Cremos que a
maior resposta a cerca do sentido do sofrimento e do amor divino foi dada por Deus ao homem na cruz de Jesus
e, somente o Cristo na cruz é exemplo máximo de sofrimento.
3.2. Cristo: Modelo de Sofrimento
Humano
Para
Moltmann é somente o Crucificado o que realiza a liberdade que muda o mundo,
porque já não teme a morte o que foi para o seu tempo escândalo e necessidade.
A morte de Cristo Jesus na cruz é o centro de toda a teologia cristã e revela
sua verdadeira e concreta humanidade para nós hoje.
Muitas
imagens de Cristo surgiram através dos séculos na América Latina. A imagem de
Cristo no índio oprimido, a sua presença na cristologia oficial, a imagem que
sublinha o sofrimento de Jesus na cruz, com a qual os pobres se identificam e
na qual associam o seu sofrimento próprio, imposto desde que lhes anunciaram
Cristo até os dias de hoje.
Desde o início, os índios vencidos que
aceitaram Cristo fizeram-no de forma específica. Não o assumiram
sincreticamente, mas do Cristo trazido pelos
vencedores assumiram precisamente aquilo que mais se assemelhava a ele:
um Cristo aniquilado e vencido. Nesse
Cristo sofredor se reconheceram e dele aprenderam paciência e resignação para
poder sobreviver com um mínimo de sentido na cruz que lhes foi imposta. O que a
religiosidade popular fez ao longo dos séculos, consciente ou inconscientemente,
foi reinterpretar a divindade de Cristo como símbolo do último reduto de poder
ante sua importância, mas o que realmente buscou foi consolo em seu desconsolo.
Até o dia de hoje o Cristo das maiorias pobres da AL é o Cristo sofredor, de
modo que a semana santa é o momento religioso mais importante do ano, nela a
sexta-feira santa e nesta a procissão do Senhor Morto[49].
Jesus
Cristo, sem dúvida, foi o maior exemplo de sofrimento humano. “Cristo é a
imagem do Deus invisível” (Col. 1.15). E é somente em Cristo que o homem limitado, finito que sofre
pode tornar-se à
imagem incorruptível do Deus incorruptível. Porque sofreu e
recebeu em si todo o mal, Cristo pode transformar todo o sofrimento em algo
significativo e proveitoso. Deus transforma morte em vida, mal em bem,
sofrimento em consolações.
Cristo
passou pelo sofrimento, passou pela cruz do Calvário, sentiu a dor, só então
obteve a vitória da ressurreição. nada exigirá do homem que não tenha exigido de si mesmo[50],
Cristo aniquila a morte, a doença, a maldição, o
sofrimento com a sua própria vida. O sofrimento é aterrador, porém a vida de
Cristo Jesus, sua vitória sobre a morte acarreta a morte de todo o sofrimento
até “a morte da morte”.
O
sofredor pode ter agora uma nova vida marcada pela experiência da cruz que o
conduz da morte para à vida do sofrimento para a libertação. E Cristo e sua cruz dão início a essa realidade
triunfante.
Moltmann,
em seu livro “El Dios Crucificado”, apresenta no capítulo três as questões
sobre Jesus, sendo que uma das questões abordadas é a discussão Jesus, hoje em
nosso ambiente cultural, entre cristãos e ateus com vistas à liberdade do homem
e a justiça no mundo. Porém nesse processo sobre Jesus no mundo temos somente
testemunhos.
O
problema interno da Cristologia não é somente a relação com a pessoa de Cristo,
sua designação com o nome de Jesus, mas sim a relação com sua história, com sua
morte na cruz. A fé pergunta continuamente por Jesus e sua significação para o
presente.El mismo Crucificado
es la base del movimiento, a alegria y el sufrimiento de toda teologia que sea
cristiana[51]. Em Colossenses 1: 15,19 lemos: Cristo é a imagem do Deus invisível. Nele habita
corporalmente a plenitude da divindade.
As
perguntas que surgem são como pode sofrer e morrer numa cruz um Deus imortal,
um ser infinito e doador da existência? E então no Cristo Crucificado estão as
respostas para o sofrimento humano. É no Cristo Crucificado que começa o futuro
da ressurreição e da vida eterna, da destruição da morte e da nova criação.
A
sociedade moderna quer alcançar felicidade sucesso sem sofrimento além de
querer superar todos os sofrimentos. Isso está fora do alcance e então para as
dores usam-se anestesias suprimindo os sofrimentos. Jesus sendo o próprio Deus
esvazia-se de sua glória e se encarna tornando-se plenamente homem. NEle temos
o exemplo máximo a seguir. Pois, como um novo Adão abre um novo tempo
escatológico para uma nova humanidade, e nos ensina, com sua vida e suas
palavras, uma nova maneira de viver a humanidade plena.
Sim,
Jesus Crucificado é a mais alta e nobre mensagem que Deus envia ao povo latino
americano. Com seu sofrimento e morte na cruz Ele, Cristo, ensina-os a encarnar
esta nova humanidade, entrando neste reino que irrompeu com a sua vinda.
Jesus,
o homem de dores, encarnação do servo sofredor, é quem somente pode estar
sensibilizado com o pobre, o doente, o oprimido, o moribundo, enfim com toda
dor humana. Porque sofreu sabe o que é padecer, então se compadece diante de
toda forma de sofrimento. Com os sinais se manifesta a sua verdadeira missão,
consolar, aliviar, curar, ressuscitar, o verdadeiro servo sofredor (IS 53.4), que
não elimina o sofrimento, porém o assume recebendo em si mesmo toda dor. Então,
não elimina as lágrimas, só
seca algumas delas ao passar (Lc 7.13;8.52), em sinal da alegria que irá unir
Deus e seus filhos no dia em que ele enxugará toda lágrima[52].
3.3. O Lado Bom do Sofrimento
Há
pessoas que vivem solitárias longe da sociabilização e quando doentes, quando
estão sofrendo são alvos da atenção, carinho e simpatia das outras pessoas, por
isso fazem da doença um meio de viver.
Também
há pessoas que quando sofrem adquirem uma percepção mais realista da própria
vida. Ilusões são desfeitas, orgulhos e então através da própria dor, do
sofrimento descobrem recursos inesgotáveis da graça de Deus. E somente a
esperança na graça de Cristo Jesus é que nos dá a visão da vida ressurreta e
eterna.
O sofrimento
causado por doença pode ser usado por Deus como um mestre. O sofrimento pode
volver o olhar do ser humano para o alto, uma vez que o maior, desejo de Deus é que Seus filhos não se
iludam sobre o que é mais vital na vida cristã, isto é, um companheirismo
estreito com Seu amado Filho[53].
A causa da cegueira do cego de Jericó (Jo 9) era a vontade de Deus, e o seu propósito, a
glória do Senhor Jesus[54].
Um
exemplo bíblico extraordinário está na história de Jó. O próprio Criador chama
a atenção para o seu caráter reto temente a Deus desvia-se do mal, também a sua
vida piedosa (Jó 1.1). Porém Deus permite a Satanás tocar em tudo o que Jó
possui, filhos, bens etc, num mesmo dia. Entretanto Jó não atribui a Deus culpa
alguma e por fim ele mesmo é afligido por doença como poucos. Ao final Jó
contempla o Deus Justo e Soberano e se curva diante da Sua santidade, recebendo
muitas bênçãos. Deus é glorificado no sofrimento de Jó e na sua enfermidade. O
conflito de Jó, verdadeiramente, foi com Deus e não com os seus três amigos
humano, pois, que a presença de Deus é real.
3.4. A Cruz de Cristo: A Vitória
Sobre Todo Sofrimento
A
América Latina conhece o Jesus, cuja vida desenrola-se entre dois momentos: o
Seu nascimento numa manjedoura e a sua morte na cruz sangüenta. Esses dois
momentos aconteceram em abandono e fraqueza.
Como
então, o latino-americano pode esperar cura lenitivo para o seu sofrimento?
Somente à luz da fé é possível ver Deus presente na manjedoura e na cruz. Sim,
na cruz de Cristo está a vitória para todo o sofrimento humano, pois, que a
presença de deus é real na cruz de Cristo. Na cruz Jesus se identifica
solidariamente com os pobres e oprimidos com o sofrimento do latino-americano,
se despojando, se doando, adoecendo, sofrendo, morrendo. É na cruz de Cristo
que se concentra:
o ponto de confluência do combate de
dimensão histórica e universal entre o mal e justiça, a maldição e a bênção, a
morte e a vida. (...) Nada há aí de resignação derrotista; tudo é padecimento
solidário e, por isso, paradoxalmente vitorioso. O Jesus morto da veneração
popular latino-americana pode ser expressão de resignado e impotente
padecimento - positivamente, porém, há até mesmo nessa caracterização um
elemento essencial para a sobrevivência na opressão - mas o Cristo crucificado,
é um combatente do amor divino. Sua cruz revela-se, em definitivo, não como
derrota, mas como a culminância vitoriosa de um combate total: por isso ‘Christus victor’, Cristo vitorioso[55].
É
um sofrimento solidário e então vitorioso; a cruz revela-se vitoriosa, porquanto,
a ressurreição se dá em meio a experiência da cruz. “A ressurreição ocorre sempre em meio a situações de
malefícios de alienação, de cruz[56].
É
mister, é urgente que o povo latino-americano se junte a Cristo Jesus em seu
esvaziamento, e vinculado e amalgamado em Cristo, por sua obra de redenção,
reflita a conformação libertadora de Cristo, em experiência de cruz e em
combate a todas as formas e forças de sofrimento, de dor, opressão maldade e
morte.
A
cruz é a forma do reino futuro, libertador, e o Crucificado é a encarnação do
Ressuscitado. É no Crucificado que está presente o final da história, o final
da dor, da doença, do sofrimento, pois que há reconciliação em meio à luta e
esperança para superar e vencer todo o sofrimento. Sim, há salvação do mestre
da cruz, o ressurreto dentre os mortos para todo sofredor da América Latina.
O
Deus do futuro está prometido na ressurreição de um crucificado e é a cruz a
concretização de toda a teologia. O Crucificado pode e traz esperança ao
sofredor, pois, que a ressurreição é a sua esperança; esperança cristianizada
concretizada no eschaton. A cruz expressa um acontecimento histórico, porém a ressurreição um
acontecimento escatológico. O crente sofredor tem como base para a sua fé e
esperança a “ressurreição de um crucificado”. Há um crucificado e existe também
uma história crucificada. E porque a ressurreição é de um Cristo crucificado há
a expressão da justiça para os sofridos não só de vida no além. Na ressurreição
do crucificado toda injustiça. Sofrimentos são superados uma vez que ficamos
diante de uma história de miséria e sofrimento que pressupõe o amor e nos
coloca em fraternidade com os que sofrem.
Moltmann
recupera a dialética da realidade e o presente entàoé diretamente miséria,
opressão, sofrimento, injustiça, pecado. Coloca a situação presente não só como
um distanciamento do futuro senão que uma contradição do futuro esperado pois
que para ele: o eschaton é o futuro e a
esperança tem o primado[57].
CONCLUSÃO
Não
possuímos todas as respostas para o porquê do sofrimento. Porém através desse
trabalho, descobrimos a resposta a partir da Cruz de Cristo. É impossível,
pois, tentar falar sobre o sofrimento, em especial sobre doença, que como vimos
é uma forma de sofrimento, sem que corramos àquele que foi o maior sofredor.
Conheceu o sofrimento como nenhum outro, recebeu em Si o sofrimento do mundo
inteiro, provou toda sorte de dor, e tal foi que morreu em uma cruz,
crucificado. Sim em Cristo e sua Cruz a resposta para todo o sofrimento humano.
A
atitude cristã frente ao sofrimento deve de ser dirigir toda atenção para as
promessas de que nossa cruz e provação deverão ser mudadas para o bem, como
jamais teríamos desejado ou pensado. Aqui está a diferença do cristão e do
não-cristão diante do sofrimento. O não cristão diante do sofrimento não tem em
que se consolar, pois não tem o consolo do maior sofredor, Cristo, e não tem as
promessas do Pai. Com nada conseguem consolar, a às vezes não subsistem, porque
não tem o consolo.
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[1] Westermann, Claus. Teologia
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[2] RIBEIRO, Helcion. Ensaio
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[3] homem efêmero. WOLFF, Walter Hans. Antropologia do Antigo Testamento p.43.
[4] FONSECA, José Saraiva. Criação, Queda e Restauração do Homem. p31,
[5] Homem efêmero, Wolff,Walter Hans. Antropologia do Antigo Testamento . p.43
[6] WOLFF, Walter Hans. Antropologia
do Antigo Testamento p.193.
[7] GERSTENBERGER, Erhard S. e SCHRAGE, Wolfgang. Por que Sofrer?
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[8] WOLFF, Walter Hans.
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[9] TERRIEN, Samuel. Jó, p. 19.
[10] TERRIEN, Samuel. Jó. p.301.
[11] BETTENCOURT, Dom Estêvão. Para Entender o Antigo Testamento. Agir,
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[15] BERNHART, J.. “mal” in Dicionário de Teologia, p.217.
[16] FITCH, William. Deus
e o Mal, p.30.
[17] ERICKSON, Millard J.. Introdução à Teologia Sistemática, p. 186.
[18] BERKHOF, Louis. Teologia
Sistemática, p. 231.
[19] LEWIS, C.S.. O
problema do sofrimento , p.65.
[20] IDEM, p.67.
[21] BERNHART, J. In: Dicionário
de Teologia. p.220. vol. III.
[22] LEWIS, C.S.. O
problema do sofrimento. p.69.
[23] LEWIS, C.S.. O
problema do sofrimento. p.70.
[24] IDEM p.81.
[25] IDEM p.83-84.
[26] FRIES, Heinrich Dicionário
de Teologia.
p.222. vol. III.
[27] G.C.D.H..”Mal”. In: O
Novo Dicionário da Bíblia, p. 985. vol. 2.
[28] DOWEY, Edward A. In: Antologia Teológica p.98.
[29] DOWEY, Edward A.. In: Antologia Teológica, p.99.
[30] IDEM, p.100.
[31] IDEM. p. 101.
[32] DOWEY, Edward A. In: Antologia Teológica. p.104.
[33] MOLTMANN, Jürgen. O
Caminho de Jesus Cristo. p. 208.
[34] IDEM, p.211.
[35] MOLTMANN, Jürgen. O
Caminho de Jesus Cristo, p.231.
[36] Idem p232.
[37]MOLTMANN, Jürgen, O Caminho de Jesus Cristo. p.237.
[38] idem p.239.
[39] MOLTMANN, Jürgen. O Caminho de Jesus Cristo. p.242.
[40] MOLTMANN, Jürgen. O Caminho de Jesus Cristo. p. 242.
[42] CALVACANTI, Eleny Vassão de Paula. Aconselhamento a pacientes terminais, p. 6.
[43] LEPARGNEUR, Hubert. Lugar
atual da morte: antropologia, medicina e religião,
p.25.
[44] Idem p. 26.
[45] Idem p. 41.
[46] MOLTMANN, Jürgen, Deus
na criação, p.390.
[47] MOLTMANN, Jügen, Deus
na criação, p.390.
[49] SOBRINO, Jon. Jesus,
O Libertador, p.26.
[50] CAVALCANTI, Eleny Vassão de Paula. Mal em Bem p.145.
[51] MOLTMANN, Jürgen. El Dios Crucificado, p.124.
[52] MOREIRA, Hamilton Sant’ana. Sofrimento,
Pp.28-29.
[53] W.W. Orr, Cura
Deus no Dia de Hoje?
P.22
[54] Idem p.24.
[55] ALTMANN, Walter. Lutero e Libertação, p. 73.
[56] ALTMANN, Walter. Lutero e Libertação, p. 73.
[57] SOBRINO, Jon. Op.
cit., p. 176.
Nota Importante: Este trabalho de monografia foi apresentado pela aluna Marilda F Ghiraldi no ano de 1999, no Seminário Teológico Antonio de Godoy Sobrinho, como requisito parcial à obtenção o título de Bacharel. Sou grato a Deus por este exelente trabalho e pela vida da minha irmã. Deus te abençoe.
SOLI DEO GLORIA
REV. RUBEN DARIO DAZA B.
Nota Importante: Este trabalho de monografia foi apresentado pela aluna Marilda F Ghiraldi no ano de 1999, no Seminário Teológico Antonio de Godoy Sobrinho, como requisito parcial à obtenção o título de Bacharel. Sou grato a Deus por este exelente trabalho e pela vida da minha irmã. Deus te abençoe.
SOLI DEO GLORIA
REV. RUBEN DARIO DAZA B.
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